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Tapajós, Carajás: quem diz que não há "estudos de viabilidade", leia este artigo. Inclusive o IDESP estudou
A Constituição de 1988 criou o Estado do Tocantins, desmembrado de Goiás, e conferiu a condição de Estados aos ex-Territórios federais do Amapá, Rondônia e Roraima. A Assembléia Nacional Constituinte preferiu remeter à Comissão de Estudos Territoriais, composta por senadores e deputados, a tarefa de estudar as demandas não contempladas na nova Carta.
O Relatório daquela comissão enfatiza os pleitos oriundos da região amazônica, dentro de “uma visão mais clara e moderna no trato com a questão geopolítica e uma preocupação em conciliar a necessidade de interiorizar a ação governamental com a promoção do desenvolvimento”, pois, “fica igualmente claro o entendimento de que os problemas de preservação da Amazônia estão relacionados com a ingovernabilidade dos seus imensos Estados”.
O relator da Comissão de Estudos Territoriais, deputado Gabriel Guerreiro, sugeriu a criação das seguintes unidades dentro da Federação:
a) Estado do Tapajós, a ser desmembrado do Pará, incluindo os municípios de Alenquer, Almeirim, Aveiro, Faro, Itaituba, Juruti, Monte Alegre, Óbidos, Oriximiná, Prainha, Rurópolis e Santarém. Por ocasião das atividades da Comissão Especial da Assembléia Legislativa do Pará que, em 1995, debateu a viabilidade econômica e administrativa das sub-regiões do Tapajós e Carajás, foram incluídos os municípios de Uruará, Medicilândia, Jacareacanga, Terra Santa, Trairão e Novo Progresso, oficializados em 1995, conforme está no Diário Oficial da União no 167, de 30 agosto de 1995. Mais tarde, foi incluída a região do Xingu.
b) Território Federal do Rio Negro, a ser desmembrado do Estado do Amazonas, incluindo, na ocasião, os municípios de Barcelos, Japurá, São Gabriel da Cachoeira e Santa Izabel do Rio Negro;
c) Território Federal do Alto Solimões, também a ser desmembrado do Estado do Amazonas, compondo-se dos municípios de Amaturá, Atalaia do Norte, Benjamim Constant, São Paulo de Olivença, Santo Antônio do Içá, Tabatinga e Tocantins;
d) Território Federal do Araguaia, a ser desmembrado do Estado do Mato Grosso, composto pelos municípios de Luciara, Vila Rica, Santa Terezinha, Porto Alegre do Norte e São Félix do Araguaia.
A Comissão considerou ainda a criação de uma “unidade territorial” de Abunã, abrangendo parte do Estado do Acre, proposta invalidada por falta de estudos a respeito, e sugeriu a criação do Estado do Triângulo, a partir do desmembramento de 74 municípios do Estado de Minas Gerais.
No caso do Estado do Tapajós, a CET justifica sua proposta afirmando que “o futuro Estado, na prática, já constitui uma unidade com vida própria, articulada em torno da cidade de Santarém. É também inegável a condição de auto-sustentação da área destacada”. Há também a justificativa por “questões de segurança”, haja vista a distância dessas áreas dos centros de poder brasileiros e a proximidade geográfica de algumas delas com países estrangeiros.
Outra Comissão Especial já havia sido formada no Congresso, proposta pelo deputado Siqueira Campos em 1975, que funcionou até 28 de novembro de 1978, com o declarado objetivo de elaborar projetos de lei sobre a revisão territorial do país e tratar da política demográfica. A motivação primeira, no entanto, era a demanda de grupos de Goiás pela criação do Estado do Tocantins, o que viria a se concretizar na Constituição de 1988.
Em 1993, outra comissão com objetivos de ampla revisão do território nacional foi proposta pelo deputado Vilmar Rocha, do PFL de Goiás, tendo o projeto sido definitivamente arquivado em 15 de março de 1995.
Remanescente da formação de um Estado centralizador, a questão territorial brasileira continua dando motivos a que se sucedam as mais variadas propostas de novos limites internos, algumas delas sem maior consistência histórica e sem justificativas que lhes permitam ser admitidas na pauta do Legislativo Federal. Entre dezenas de propostas apresentadas ao público, elaboradas por estudiosos ou políticos, várias delas chegaram a tomar forma de projetos cujos autores intentaram ou intentam vê-los aprovados pelo Congresso Nacional.
Com relação à chamada Amazônia Legal, entre 1963 e 1995 destaca-se a apresentação, na Câmara Federal, de nove projetos de criação de Estados ou Territórios Federais, cinco dos quais incluem o Tapajós. Somando-se às propostas oriundas da Comissão de Estudos Territoriais, a Amazônia representa a parte do Brasil que mais tem motivado propostas de uma nova configuração político-administrativa, com a tramitação, no Congresso, de vários projetos referentes ao desmembramento do Pará, Amazonas e Mato Grosso.
Com relação ao Tapajós, um dos argumentos introduzidos no ideário separatista é motivado pelas semelhanças entre os limites físicos do projetado Estado e os limites estabelecidos pelo do IBGE, em 1968. No Estudo de Viabilidade Econômica do Estado do Tapajós há todo um capítulo sobre “as divisões que já existem, naturais e econômicas”, como forma de justificar a reivindicação local.
Diz o Estudo de Viabilidade Econômica: “Utilizando critérios econômicos, sociais e populacionais, o IBGE traçou no mapa do Brasil, com precisão quase absoluta, o novo Estado do Tapajós. Isso aconteceu em 1968”. Naquele ano o IBGE estabeleceu as chamadas Microrregiões Homogêneas. Na composição dessas microrregiões foram considerados os chamados domínios ecológicos, população, regiões agrícolas, atividade industrial, infra-estrutura de transportes, atividades terciárias, entre outras características.
O Estado do Pará foi dividido em 15 microrregiões, sendo que as MRH 12, 13 e 14, à exceção do município de Porto de Moz, englobam os 11 municípios então projetados para formarem o Estado do Tapajós.
Outra divisão institucional tomada como referência pelo movimento autonomista é o chamado Zoneamento Ecológico-Econômico do Estado do Pará, estabelecido pelo IDESP em 1991, composto de 13 zonas segundo suas características de atividades produtivas, centros urbanos de influência restrita, presença de jazidas ou depósitos minerais, hidrovias, rodovias e ferrovias (existentes ou projetadas), potencial florestal e vegetação campestre, projetos de governo ou grandes projetos, fertilidade do solo, áreas indígenas ou equivalentes, recursos hídricos, infra-estrutura industrial, comunicação, estrutura fundiária, domínios morfo-estruturais e relevo, áreas de conservação da natureza e projetos de colonização.
Nesse Estudo de Viabilidade Econômica está escrito na página 23: “Pode-se observar no estudo do IDESP que as áreas destinadas ao futuro Estado do Tapajós estão concentradas em quatro zonas levantadas pelo estudo, formando uma unidade própria”. As quatro zonas são denominadas Baixo Amazonas, englobando as subzonas de Oriximiná, Monte Alegre, Almeirim e Santarém; zona do Tapajós-Jamanxim; zona de Tumucumaque e zona do Cachimbo.
A utilização daquelas formas de divisão institucional tem o objetivo de demonstrar a região Oeste do Pará como um espaço físico e social dotado de características particulares que se constituem, para os idealizadores do movimento, num item destacado de sua reivindicação. Buscam, assim, o aval de instituições oficialmente autorizadas, uma forma de justificativa de procedência externa, como se aqueles limites formalmente instituídos pudessem ser tomados também como irrefutáveis no jogo da luta pela emancipação.
Uma abordagem aproximada é desenvolvida por Benchimol, em 1977, que vê o estabelecimento de planos gerais de desenvolvimento da Amazônia, pelo governo federal, como espécie de substitutivo à criação de novas unidades autônomas, notadamente quando o autor se reporta à política de pólos, instituída pelo Decreto n.º 74.607, de 25 de setembro de 1974, com o qual o presidente Ernesto Geisel criou o Polamazônia. No caso desse programa, os pólos paraenses do Tapajós e Carajás coincidem mais ou menos, fisicamente, com a divisão proposta pelos movimentos autonomistas daquelas duas regiões. Para o autor amazonense, a criação da SPVEA, em 1953, mais tarde substituída pela Sudam, mesmo tendo como motivação o interesse nacional, tem um componente que deriva da necessidade de reordenamento territorial da região.
Benchimol é de opinião que “falta apenas o braço político para completar o ciclo dessa nova estratégia”, ou seja, a instituição de novos Estados e territórios autônomos que, segundo o autor, viriam a ser os agentes do desenvolvimento regional.
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