terça-feira, 23 de outubro de 2007

Artigo do Economista Roberto C. Limeira de Castro, titular do blog www.obrasilnovo.blogspot.com

Quarta-feira, 15 de Agosto de 2007

As Sardinhas enlatadas e os abandonados do vácuo sem República

Os movimentos de criação de novos Estados represados por séculos, são as causas maiores do caos e da violência urbana e rural no Brasil, porquanto, vem obrigando metade dos brasileiros a viverem amontoados numa área equivalente ao Japão e a outra metade, abandonada num vazio territorial, equivalente a quinze Franças, ambas as populações, sem as instituições republicanas básicas.



Atento às discussões sobre a criação de novos Estados no Brasil há cerca de 30 anos, pudemos acompanhar os calorosos debates em torno da emancipação de Mato Grosso do Sul, Tocantins, Amapá e Roraima, além das frustradas tentativas de admissão à União Federal do Estados de Tapajós, Maranhão do Sul, Triângulo, Santa Cruz, Juruá e São Francisco durante a Assembléia Nacional Constituinte de 1988. Agora, acompanhamos e participamos intensamente do monólogo dos que desejam a emancipação de Carajás, Araguaia (ou Mato Grosso do Norte), Minas Norte e da criação de quatro Territórios Federais plausíveis, Marajó, Juruá, Solimões e Rio Negro.

Quando falamos de monólogo não estamos exagerando, porquanto, aos argumentos econômicos, sociais, técnicos, político-administrativos e geográficos dos que desejam um Brasil mais equilibrado, apenas se contrapõem às mistificações vazias e às mentiras deslavadas dos defensores de “status quo” e do atual estágio de esgarçadura do tecido social brasileiro.

Os argumentos dos dois lados são, absolutamente, os mesmos de há séculos. De um lado, os porta-vozes das cortes dos gigantescos e ingovernáveis territórios reclamando de que os movimentos não são do povo, mas, de uma elite interessada nos cargos públicos e em seus salários – e quem disso usa, disso cuida – e do outro, as legítimas lideranças libertárias, porquanto, receberam milhares de votos da população que representam, se esgoelam no parlamento para exigir melhorias diante do abandono a que estão submetidas os seus representados.

Pelo desfecho da história, os defensores do indefensável, mesmo levando uma sonora goleada histórica, manobram desesperadamente para ganhar o máximo de tempo que puderem nos seus privilégios de concentração de rendas. É o velho cabo de guerra entre os que almejam o progresso da humanidade e os que querem mantê-la no atraso, apenas vislumbrando a sua míope ótica individualista.

Quem se der ao prazer de ler as histórias do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e de Alagoas com relação à Capitania de Pernambuco encontrará o mesmo debate há dois séculos entre as elites da corte de Recife e a libertação dos visinhos extorquidos, após o açambarcamento em 1799 das três primeiras Capitanias e do movimento de emancipação das mesmas e da emancipação da Comarca de Maceió.

E assim, sucessivamente, ao longo de toda a nossa história. Porto Alegre se aliou a Desterro (atual Florianópolis) na emancipação de Santa Catarina e de São Pedro do Rio Grande (atual Rio Grande do Sul) na batalha contra o jugo dos paulistas e cariocas.

O Paraná somente emancipou-se dos paulistas, cerca de 120 anos depois da drenagem de suas economias, o mesmo acontecendo com Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso em relação à Capitania de São Paulo e do Piauí contra São Luis.

Assim, também, foi o sofrimento da emancipação do Amazonas em relação à Belém, de Rondônia e Mato Grosso do Sul em relação à Cuiabá e Tocantins em relação à Goiânia.

No caso das comarcas de Ilhéus e Porto Seguro que já tiveram “status” de Capitanias, além da comarca de São Francisco, a pendenga se arrasta pelos cinco séculos de nossa história.

São Francisco saiu das garras de Recife e foi presa fácil de Salvador, enquanto as duas ex-Capitanias do sul da Bahia, empobrecidas pelos ataques dos Aimorés, foram simplesmente tragadas pelo apetite fiscal dos Governos Gerais da Capital baiana.

Menos sorte não teve a comarca de Paracatu nos sertões da Farinha Podre (região do triângulo mineiro), que imprensada entre quatro gigantes, Pernambuco ao norte, Goiás a oeste, São Paulo ao sul e Minas Gerais ao leste, ficou trocando de exatores das receitas fiscais públicas até os dias atuais. Mesmo assim, os “triangulinos” não desistem da criação do seu Estado.

Apesar dessas inúmeras vitórias e derrotas históricas acima citadas, o Brasil tem muito que realizar nesse campo da concentração territorial como extensão inequívoca da concentração de riquezas e da espoliação fiscal.

A concentração territorial que leva à concentração de terras, de latifúndios, de riquezas e da população amontoada em exíguos nichos urbanos do país tem sido ao longo dos séculos a principal responsável pelo atual estado caótico, de exclusão social e violência das grandes áreas metropolitanas brasileiras.

Extorquidas dos seus direitos mínimos às instituições republicanas, à democracia representativa, à ordem e ao progresso estampados em nosso pavilhão auriverde e a uma vida digna, os brasileiros das áreas abandonadas migram em massa para a miséria e a exclusão social das favelas e guetos dos grandes conglomerados metropolitanos.

E de nada adianta os brasileiros ficarem esbravejando contra o banditismo galopante, chorando pelos seus milhares de jovens entre 20 e 25 anos trancafiados nas prisões, do caos aeroportuário, da falta de estradas, de saúde, de educação, de transportes urbanos, de polícia, de justiça etc.

Todo esse caos está diretamente relacionado com a arcaica, anacrônica e ultrapassada divisão territorial e político-administrativa do Brasil, cujo equacionamento se arrasta por séculos.

De nada adianta o Brasil ter um território, gigantesco, riquíssimo em recursos naturais, terras férteis, florestas imensas, minérios sem fim e rios caudalosos, se a sua elite, conservadora, egocêntrica, caolha e hipócrita, continua espremendo os seus filhos desprotegidos e sem cidadania em barracos fétidos e amontoados ou em presídios em petição de miséria.

E não tenhamos mais dúvidas a esse respeito. Os que defendem a atual conjuntura político-administrativa e territorial do país foram, são e serão, os únicos responsáveis por tudo de ruim que aqui descrevemos.

Os números falam por si próprios. Enquanto cerca de 95 milhões de brasileiros vivem, precariamente, sem as instituições republicanas em 97,7% do seu território, os outros 95 milhões se espremem em 2,3% ou cerca de 200.000 Km² no caos e na violência das 30 ou 32 áreas metropolitanas, com metade deles, também, sem os benefícios da República, já proclamada há 108 anos.

A Organização das Nações Unidos, já advertiu, oficialmente. Serão nove bilhões de seres humanos vivendo em sua maioria nas áreas urbanas em 2050, dos quais, mais de metade viverão em 375 mil favelas existentes no mundo. Na proporcionalidade, o Brasil terá 145 milhões de brasileiros vivendo espremidos numa área menor que o Japão e a outra metade no vazio de 15 Franças.

Essa é a cruel conjuntura que cerca de 100 heróicos brasileiros da Frente Parlamentar pelo Re-ordenamento territorial e político-administrativo do Brasil tentam aperfeiçoar no Congresso Nacional e denunciar à população brasileira.

Quarenta e três anos passam como num passe de mágica. Por favor, senhores governadores, senadores, deputados, ministros e o Presidente da República e principalmente, os concentradores de riquezas, não vamos mais esperar meio século e inviabilizar o país em todos os sentidos para sempre.


Roberto C. Limeira de Castro

Nenhum comentário: