quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Porque votar pela Divisão do Estado do Pará

Por: Rosária Lana de Oliveira Lima

Muitas manifestações eloqüentes e discussões inflamadas tem-se destacado a respeito do assunto: A Divisão do Estado do Pará.
E se parássemos e analisássemos a luz da realidade dos municípios envolvidos. Os debates giram em torno de quem vai ganhar ou perder essa ou aquela riqueza. Não se trata de ganhar ou perder e sim de pensar naqueles que jamais chegaram a ganhar e sempre perderam o pouco que tiveram.
Peço que me escutem como moradora de um dos municípios que clamam pela separação, como forma de obter o mínimo de sobrevivência, Marabá, onde resido há 27 anos. Peço que me escutem como apaixonada pela cidade de Belém, lugar onde eu cresci, estudei e cultivo os melhores amigos, além dos meus queridos familiares. Peço que me escutem como alguém que, no fundo, se manteve sobre a linha que divide os separatistas dos não separatistas até a sua decisão.
Então, porque Separar?
Vou justificar a escolha, de acordo com os perfis da minha personalidade, como cidadã.


Perfil 01: Como uma cidadã que discute os problemas políticos sociais do país.
Não posso aceitar os argumentos espalhados pela Internet de que a divisão do Estado do Pará seria um festival de cargos políticos, ávidos a se beneficiarem pela criação de novos postos. Pensar assim é admitir a nossa incompetência, latente e arraigada aos costumes, para escolher nossos representantes. É reiterar aquilo que temos feito sempre: votamos mal, reclamamos dos políticos que votamos e, por fim, nada fazemos para mudar. Fica assim instituída oficialmente a desculpa para todas as nossas faltas. Sempre arrumamos os “culpados” perfeitos para encobrir nossos inúmeros defeitos na qualidade de cidadãos (jogar lixo nas ruas, avançar a faixa de pedestres, votar mal e etc...). “Montamos” essa “estória” cômoda para nós mesmos e cruzamos os braços, a reclamar de tudo. É muito passivo votarmos mal, mas sermos beneficiados por morarmos na capital e região e não nos preocuparmos com o Estado como todo. A velha e boa conversa: “Se está bom aqui pra mim, o resto é o resto”. O verdadeiro cidadão não deve pensar assim.
Portanto, sugiro se realmente o aumento das cadeiras políticas, que poderão vir a representar os novos Estados criados, deverá beneficiar a Região Norte como todo. Acredito que sim, pois teremos mais representantes, da Região Norte, no Congresso Nacional. Agora, a consciência e cobrança de ações dos políticos em que votamos independe da divisão ou não do estado. Não misturemos as coisas.


Perfil 02: Como cidadã trabalhadora que saiu da sua origem para buscar novas oportunidades.
Muito se comenta que as regiões do Pará, distantes da capital do Estado, foram ocupadas por “sulistas” em busca de aventuras e que eles não são merecedores e nem legítimos para defenderem a causa separatista. Assim como os “sulistas”, também procurei oportunidades nas longínquas terras do Pará, porém como poucos, vim de Belém.
A princípio, precisamos entender que os tais “aventureiros” que aqui se estabeleceram são legítimos brasileiros e como tal tem assegurado o livre trânsito pelo território nacional. É melhor que os espaços vazios, não ocupados por falta de interesse dos nativos, serem ocupados por brasileiros do que por estrangeiros. Nunca houve muito interesse dos próprios paraenses em ocuparem as lacunas e produzir em seu próprio Estado. As justificativas são compreensíveis: falta de estrutura sob todos os aspectos. Porém os “estrangeiros” do Sul e Centro Oeste (e até do próprio Norte, como eu) do nosso Brasil, não se intimidaram diante das adversidades, enfrentando-as com trabalho, para que este território abandonado pudesse produzir e conseqüentemente, fortalecer a sua identidade.
Quando se fala de reforma agrária, muitas bandeiras são levantadas contra a prática do latifúndio, onde a grande propriedade é mantida, sem, nela, nada produzir, apenas pelo desejo de tê-las, admirá-las e guardá-las à especulação. As mensagens e propagandas, em prol da não divisão do Estado, são o retrato do discurso do latifundiário, onde se retumba algo como: “Pará que te quero Lindo e grande”. Querem o Estado lindo e grande, mas não querem dele cuidar, relegando-o ao abandono. Grande parte territorial serve apenas como objeto de admiração a ser guardado como reserva de futura especulação. Tudo muito análogo ao conceito do Latifúndio.
Nem mesmos os cargos criados pelo próprio Estado do Pará, são ambicionados pelos paraenses. Muitos concursos oferecidos pelo Estado, nos interiores distantes, têm suas vagas ocupadas por paulistas, goianos, mineiros, tocantinenses, entre tantos brasileiros. A maioria deles(os de outros estados) nunca antes esteve próximo da região Norte, no entanto viram nas vagas oferecidas pelo Estado, uma oportunidade de trabalho e emprego, mesmo que tendo que enfrentar toda sorte de abandono da infra-estrutura estadual: estradas, saneamento, saúde e outros. São poucos os paraenses interessados nos postos de trabalho oferecidos tanto pela iniciativa pública, quanto privada, quando esses postos são em cidades distantes da capital. Os trabalhadores deste lado do Estado formam uma “Torre de Babel” brasileira. Temos juízes, garis, delegados, peritos, engenheiros, advogados, donas de casa, professores, médicos, fazendeiros, trabalhadores rurais e vários profissionais que vieram de outros Estados para ocupar postos nunca reivindicados pelos donos da Terra Natal, Pará.
No roteiro de lazer daqueles que moram na capital, com raríssimas exceções, não estão incluídas as cidades do interior do Estado, que não sejam aqueles balneários beneficiados pela proximidade à cidade de Belém. Porque não é interessante viajar pelo interior distante do nosso Estado? Seria pela falta de estrutura turística, ou seria pela má conservação das estradas? Seria pela falta de opções de lazer e sobrevivência não incentivadas e/ou esquecidas pelo Estado e seu povo? Convido-os a um passeio por nosso Estado, aventurando-se pelas estradas, em ônibus ou em seus carros particulares e entenderão parte de nossas preocupações.


Perfil 03: Cidadã, dona de casa e mãe de família.
Em janeiro de 1985, cheguei a Marabá, recém casada, sem filhos e sem intenção de tê-los de imediato. Tive a oportunidade de conviver com mães que chorosamente se separavam de seus filhos, pois eles teriam que sair da cidade, para continuar seus estudos em outras cidades, a exemplo: Belém, Goiânia, São Paulo e Belo Horizonte. Na época pensei: eu ainda nem tenho filhos, e quando os tiver, até que eles cresçam teremos faculdades na cidade de Marabá e tudo será diferente. As crianças chegaram, cresceram e em nada mudou. Eles foram estudar em Belém e por lá concluíram seus cursos e ainda precisam permanecer para aprimorar técnicas em cursos de pós-graduação existente apenas em grandes cidades. Além da dor da separação e da enorme preocupação, pois os pais não podem abandonar seus postos de trabalho para acompanhar os filhos, as despesas inerentes a uma empreitada dessas é alta. Apenas para citar um exemplo: se aqui tivesse faculdade na época, não teríamos que pagar o aluguel, pois eles estariam na casa deles. Não é justo, trabalhamos aqui, na terra abandonada e darmos lucros aos proprietários de imóveis em outra cidade/Estado. O que produzimos é gasto em dobro a fim de garantir nossa sobrevivência aqui e de nossos filhos em outra localidade. Com o resultado do nosso trabalho, investimos em escolas, casas, impostos, livros, empregados e todas as espécies de serviços, na cidade estranha à morada da família. Hoje, muito timidamente, houve algum progresso nas instituições de ensino, vindas do poder governamental, num ritmo que não acompanha o clamor da sociedade formada pelas cidades interioranas/distantes da capital do Estado do Pará. Contudo, devo considerar-me com privilégios, pois a grande maioria da população aqui residente simplesmente abandona os estudos, tornando-se refém das casualidades na condição de mão-de-obra sem qualificação. A maioria dos profissionais, como eu, submeteram-se a sacrifícios financeiros e pessoais, para obter especialização/pós-graduação em suas áreas de trabalho, viajando para grandes capitais/cidades, uma ou duas vezes por mês, aos finais de semana, já que não há interesse das grandes instituições de ensino, mesmo que particulares, em instalarem seus cursos nesta região, por absoluta falta de estrutura.
E assim, poderíamos deixar este texto mais longo se citássemos, além das questões da educação, as de saúde, saneamento, lazer, turismo, transportes e segurança. Se, para quem mora na capital e região a carência é gritante, há que se fazer uma projeção geométrica negativa, para imaginar a situação dos interiores distantes.


Perfil 04: Cidadã que já passou pela experiência de divisão de município.
No ano de 1985, quando da minha chegada em Marabá, algumas cidades tais como: Parauapebas, Curionópolis e mais alguns outros municípios, eram vilarejos pertencentes ao município de Marabá. Em 1988 ocorreu a emancipação de Parauapebas e com ela a Serra de Carajás (minério de ferro) deixou de pertencer a Marabá, passando ao domínio de Parauapebas. Essa separação contou com a aversão da maioria daqueles que residiam no núcleo da cidade de Marabá, pois a população achava que, com a “perca” da Serra dos Carajás, Marabá estaria decretada à falência. Com o passar do tempo Curionópolis, município, onde está localizada a Mina da Serra Pelada, também foi politicamente emancipada e algumas outras cidades no entorno seguiram o mesmo processo. O resultado foi surpreendente! Não empobreceu Marabá. Não fomos à falência. Ao contrário, a cidade se desenvolveu, bem como a região inteira. Quem conheceu os vilarejos de Parauapebas e Curionópolis, no passado, quando pertenciam ao município de Marabá sabe do que relato. Hoje são cidades que se desenvolveram, sem as garras do município mãe (Marabá), porém com parceria. Essa é a palavra, parceria. A região se desenvolveu tanto, que hoje é parte integrante do bloco de municípios do Sul do Pará que clama pelo Estado de Carajás. Da mesma forma acontece nos municípios, do Oeste do Pará, que clamam pelo Estado do Tapajós.
Não dá para entender todo esse processo como divisão e sim como adição. Não vamos chamar de divisão, vamos entender como cotização, objetivando agregar forças e aumentar nosso poder de reivindicação. A Região Norte é tão grande, quase sempre relegada ao segundo plano, mal gerida e esquecida. Todos no Brasil e no mundo querem dar palpites, mas não querem arcar com o ônus de sua gestão. Sabemos que a gestão de um Estado grande gera gastos desnecessários, influindo no custo/benefício. Temos no mundo países pequenos, infinitamente menores que nosso Estado e que são modelos de gestão e eficiência. Vamos deixar de lado o egoísmo de possuir um bem, sem mesmo poder tomar conta dele, apenas para não perdermos o domínio. As gestões feudais ficaram no tempo e para elas não queremos voltar, pois não funcionam. Hoje a palavra de ordem é delegar poderes para melhor gerir. Falamos tanto em modernidades, gestões participativas; cobramos essas atitudes de nossos gestores dentro das empresas em que trabalhamos e, quando chega a nossa vez de praticar, não conseguimos nos enquadrar nos conceitos pelos quais tanto levantamos bandeiras. Ficamos agarrados a uma grande bola de problemas, sem condições de resolvê-los, porém não chamamos ninguém para ajudar a gerir, dividir o fardo e salvar a bola, preferindo perdê-la totalmente.
Lembrem-se: não deixaremos de ser nortistas, não deixaremos de ser brasileiros.

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